Por Alexandre Mansur - Diretor de projetos do Instituto O Mundo Que queremos e coordenador da campanha Amazônia no Centro
Vivemos duas crises ambientais simultâneas, uma climática e uma hídrica. Essa é a má notícia. A boa é que várias iniciativas mostram como é possível salvar, ao mesmo tempo, as nascentes brasileiras e o clima do planeta. Um caso de dupla solução é o replantio de florestas nativas em áreas de mananciais.
Uma das organizações especializadas nessa regeneração florestal é a Iniciativa Verde. A instituição sem fins lucrativos contribui desde 2005 com o desenvolvimento rural sustentável, a adaptação e mitigação às mudanças climáticas e a melhoria dos serviços ambientais e ecossistêmicos, como a manutenção da biodiversidade, a provisão de água e a qualidade do ar. Ao todo, são mais de 3 mil hectares de florestas sendo restauradas. Uma das principais frentes deste trabalho é o Carbon Free, programa de compensação de emissões de gases de efeito estufa por meio da restauração florestal. Nele, o cálculo de compensação de CO2 de uma empresa ou negócio é convertido em árvores plantadas.
Implantação de mudas para restauração. Paraisópolis (MG), mar. de 2023.
“Nós trabalhamos com propriedades privadas ou áreas públicas que atendam o critério da adicionalidade, isto é, que não tenham a obrigatoriedade de fazer esse plantio. Se o proprietário foi multado por desmatamento, por exemplo, já não pode levar um projeto como esse para aquela área”, explica Roberto Resende, agrônomo, mestre em Ciência Ambiental e diretor da Iniciativa Verde. O Carbon Free, que é pioneiro no Brasil, já permitiu a restauração florestal, em diversos estados do país, de áreas que antes eram apenas pasto. Atualmente, boa parte dos projetos da Iniciativa Verde está concentrada na Serra da Mantiqueira, no lado de Minas Gerais, e em fazendas do interior de São Paulo.
Essas árvores podem levar de 20 a 30 anos para crescer. Por isso, a instituição trabalha com indicadores técnicos estabelecidos pela Resolução 32/2014 da Secretaria do Meio Ambiente de São Paulo, que define os critérios que apontam quando um projeto está andando sozinho. Ou seja, que não precisa mais de manutenção constante. “Não adianta só distribuir as mudas, é preciso fazer todo o estudo daquela área, do solo, do entorno, e o acompanhamento”, conta. Para isso, a Iniciativa Verde mobiliza uma equipe local, com o apoio de organizações e instituições, e também gerando renda e empregos indiretos para a comunidade. “Estabelecemos relações para que mais pessoas se apropriem da iniciativa, já que o projeto tem que ser cuidado por, no mínimo, 3 anos. Depois disso, o proprietário da área pode tocar sem a nossa assistência. No geral, temos conseguido entregar as áreas entre 3 e 7 anos”, diz.
Área de restauração florestal em desenvolvimento. Piracicaba (SP), ago. de 2023.
O plantio faz parte das compensações de carbono da Editora Globo dentro do projeto Um Só Planeta. Numa parceria com O Mundo Que Queremos e a Iniciativa Verde, o plantio compensa as emissões das revistas, impressos, jornais e rádio CBN, todos integrantes do grupo. Para isso, foram necessários 7,72 hectares, que se encontram divididos em dois projetos de restauração ecológica, sendo 3,86 hectares no projeto Fazenda da Toca I, em Itirapina e Analândia (SP), e 3,86 hectares no projeto Fazenda Candeia, em Extrema (MG). Mas, afinal, como isso favorece o clima do planeta?
“Árvores não produzem água, mas colaboraram para regular a quantidade de água ao longo do ano”, lembra Roberto. Ele explica que, quando há vegetação nativa, as árvores ajudam a atenuar as cheias e as secas, ao mesmo tempo. “A vegetação mantém a água no solo e vai soltando aos poucos, como se fosse uma esponja. Isso não só ameniza a seca como ajuda a preservar as nascentes. Em um terreno sem vegetação, se cai uma chuva forte de verão, é provável que ocorra uma enchente. E é fato que, tendo mais vegetação nativa, os rios e as represas ficam cheios ao longo do ano”, diz o especialista. Além disso, a vegetação serve de filtro para a água. “Estudos mostram que o custo do tratamento de água da Sabesp é mais caro em bacias onde não tem vegetação e mais barato onde tem, porque chega menos sujeira na água”.
Em nível global, a restauração da floresta nativa colabora diretamente com dois aspectos centrais na questão das mudanças climáticas. O primeiro deles é a mitigação, que é a tentativa de não deixar o carbono ir para a atmosfera. “Ao plantar árvores, estamos fixando o CO2 naquelas árvores, e sabemos que uma floresta segura mais de 300 toneladas de carbono, muito mais do que uma plantação, por exemplo”, afirma Roberto. O segundo aspecto é a adaptação, que é quando a vegetação nativa ajuda a regular o clima e o ciclo da água, a amenizar a seca e aumentar a produção de alimentos em determinada região. “Precisamos, com urgência, argumentar com as pessoas que as mudanças climáticas já estão acontecendo e, para se adaptar a elas, precisamos preservar e recuperar vegetações nativas”, enfatiza o especialista.
*Via Um Só Planeta