PLANAVEG: Um bom plano que ainda requer ajustes e melhorias

PLANAVEG: Um bom plano que ainda requer ajustes e melhorias

Categoria(s): Arquivo

Publicado em 03/08/2015

Por Roberto Resende*

 O Ministério do Meio Ambiente (MMA) apresentou para consulta pública a versão preliminar do Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (PLANAVEG) em dezembro de 2014, como um instrumento para a implementação da nova lei florestal (http://www.mma.gov.br/biodiversidade/proposta-para-recuperacao-da-vegetacao-em-larga-escala). Este documento pode ser entendido como um mapa para o Brasil cumprir, além da previsão legal, os compromissos assumidos em nível internacional como o mais recente de se fazer a recuperação dos 12 milhões de hectares de áreas desmatadas até 2030. Após um longo período sem definição sobre a data limite de respostas a esta consulta, foi estipulado como prazo final o dia 9 de agosto.

A proposta apresentada é bastante abrangente, resultado de consultas com grupo expressivo de especialistas. Em seu conjunto, o documento é bastante positivo. Apontamos aqui, porém, dois níveis de questões visando contribuir para um melhor desenho e implantação do Plano. O primeiro é sobre a participação ainda tímida, seja de setores governamentais ou da sociedade civil em sua formulação. Apesar do processo de consulta inicial ter sido mais amplo que outras experiências do tipo ainda precisa ser incrementada. A própria maneira de consulta pública, inicialmente sem prazo definido e com pouca publicidade, não contribuiu para o fortalecimento da proposta. Cabe observar também que o envolvimento das outras áreas de governo e da sociedade deve ser mais bem encaminhado para que o PLANAVEG não se torne mais um documento sem apoio e com execução limitada. O segundo se refere a alguns pontos do documento, detalhados a seguir.

Em relação às políticas públicas complementares podemos sugerir alguns acréscimos. A começar do item intensificação da sustentabilidade da agropecuária, que trata de diversos instrumentos de política pública, tais como:
• Programa ABC. Sugere-se aqui a inclusão de cláusulas mandatórias (contrapartidas) ou no mínimo indutoras para os tomadores destes recursos, além da comprovação de um mínimo de regularidade perante lei como a exigência de CAR e PRADA. Exemplos seriam incluir nos projetos de recuperação de pastagens a obrigação de cercamento das áreas de preservação permanente (APPs), prever sempre medidas de conservação de solo nas áreas de uso consolidado (“boas práticas agronômicas”);
• Demais linhas de crédito. É importante mencionar outras linhas, em especial o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF). As linhas mais voltadas ao tema (como PRONAF ECO, Floresta) têm um desempenho muito baixo. Assim, o PLANAVEG poderia focar os possíveis pontos se melhoria deste Programa (a começar por uma melhor difusão entre agentes financeiros, técnicos extensionistas, organizações de agricultores, etc);
• Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER). A Política Nacional de ATER pode ser incluída nesta linha de intensificação da sustentabilidade. Apesar de haver previsão específica o envolvimento do MDA, MAPA e entidades estaduais ainda parece incipiente nesta proposta. A estratégia não prevê apoio para a inscrição no CAR neste componente, o que certamente é importante na mobilização dos proprietários, vinculado com o planejamento de uso da terra dos imóveis rurais.

Além disso, existem outras normas que definem políticas públicas, em nível federal, ligadas ao tema do Plano. Exemplos:
• Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC) Lei 12.187/2009. Prevê como objetivo (artigo 3º, inciso VII) a “consolidação e à expansão das áreas legalmente protegidas e ao incentivo aos reflorestamentos e à recomposição da cobertura vegetal em áreas degradadas”;
• Lei 12.805/2013, de 29/04/2013, Política Nacional de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta. Esta linha sinaliza para integrar esforços desenvolvidos em diversos campos (como, por exemplo, na pesquisa pela Embrapa), de integração das florestas nos sistemas produtivos;
• Lei 12.854, de 26/08/2013, fomento e incentivo à recuperação florestal e a implantação de sistemas agroflorestais. Conforme esta lei o “Governo Federal incentivará e fomentará, dentro dos programas e políticas públicas ambientais já existentes, ações de recuperação florestal e implantação de sistemas agroflorestais em áreas de assentamento rural desapropriadas pelo Poder Público ou em áreas degradadas que estejam em posse de agricultores familiares assentados, em especial, de comunidades quilombolas e indígenas.”

Em relação à implementação das determinações da Lei 12.651/2012, propõe-se considerar de forma mais explícita os instrumentos econômicos, em especial os previsto no artigo 41. Na questão de oferta de insumos é importante a relação com o Sistema Nacional de Sementes e Mudas (Lei 12.711/2003). É necessário prever o seu aperfeiçoamento, simplificando os mecanismos referentes à produção de sementes e mudas, especialmente para produtores comunitários e não governamentais. E também legislações e regulamentos estaduais, como os Programas de Regularização Ambiental (PRA), as Políticas de Recursos Hídricos, Mudanças Climáticas, dentre outras, devem ser consideradas para o sucesso do Plano.

Um dos principais pontos a desenvolver é quanto ao tema orçamento. Os custos médios apresentados (menos de R$ 5 mil/ha) são bastante otimistas (considerando a realidade da região Sudeste em especial), ainda mais se for considerada a instalação das cercas, que são frequentemente necessárias. É evidente a necessidade de redução de custos, o que deve ser enfrentado com uma avaliação mais detalhada das diversas variáveis envolvidas para tanto. Os ganhos de escala não são lineares neste tipo de atividade, que por natureza é fragmentada e feita em diversas condições ambientais, econômicas e sociais, com diferentes disponibilidades de recursos e arranjos operacionais variados.

A proposta pode incluir o reforço de busca de fontes alternativas de recursos, como compensações voluntárias (de emissões de gases de efeito estufa, por exemplo) e compulsórias de empresas (como o Programa Nascentes, de São Paulo, conforme o Decreto Estadual 60.521/2014). Em relação à iniciativa de desenvolver e implementar uma plataforma de planejamento espacial e monitoramento em nível nacional, propõe-se uma melhor avaliação para haver redundância com sistemas já existentes e/ou previstos, em nível federal e estadual, a começar do SICAR.

Na estratégia geral a questão de redução de custos para a recuperação deve ser focada. É oportuno que o documento reforce os pontos referentes ao fortalecimento da cadeia produtiva (serviços e produtos adquiridos fora dos imóveis rurais), diretriz fundamental. Além disso, propõe-se aqui que seja dada mais atenção à possibilidade de prever e estimular ao máximo a auto execução (em analogia à autoconstrução de moradias) por parte dos proprietários, sempre que possível. Assim, pode se obter maior engajamento e menores custos de transação, com o maior uso possível de fatores já disponíveis no imóvel (trabalho, máquinas etc).

De modo geral, o documento pode apontar melhor o potencial de sistemas agroflorestais, que em muitas situações podem receber maior adesão pelos agricultores (possibilidade de uso de PRONAF e mesmo de recursos próprios). Os benefícios diretos aos imóveis rurais (“as internalidades”), como a água, atenuação de pragas e doenças, conservação de solo, entre outros, também podem ser mais explicitados na Visão e Objetivo, bem como nas estratégias de comunicação.

O quadro fatores de sucesso deve ser mais bem avaliado, como o próprio documento sugere. Esta avaliação dos fatores de sucesso varia por região biogeográfica, tendo sido classificados em presentes, outros estão parcialmente presentes e outros ausentes. Como diretriz, o PLANAVEG propõe foco nos que estão ausentes ou parcialmente presentes. O predomínio dos ausentes é grande ao final (97 de 155). A distribuição por regiões traz um quadro mais favorável para a Mata Atlântica. Isto reflete talvez, além de melhores condições nos estados do Sul, Sudeste e parte do Nordeste, uma avaliação com viés da maior participação de representantes destas áreas.

Concluindo, é fundamental o engajamento dos diversos atores envolvidos nesta discussão, que pode viabilizar (ou não) um dos principais instrumentos para a aplicação da nova Lei Florestal, contribuindo para um melhor manejo dos recursos naturais e a sustentabilidade em suas diversas dimensões.

*Agrônomo e presidente da Iniciativa Verde