Parte da água para consumo está comprometida, segundo análises do Plantando Águas

Parte da água para consumo está comprometida, segundo análises do Plantando Águas

Categoria(s): Arquivo

Publicado em 16/07/2015

Por Isis Nóbile Diniz

Quase todas as propriedades rurais participantes do projeto Plantando Águas, patrocinado pela Petrobras, não tem água encanada. Em geral usam para consumo próprio a água de fontes naturais localizadas perto de casa. Mas será que essa água é potável, ou seja, ideal para consumo em casa e para a rega de alimentos? Para responder a essa questão, uma atividade que fez parte do projeto foi analisar 22 pontos de corpos de água usados pelos agricultores participantes do Plantando Águas. Infelizmente, notou-se que em vários pontos as águas contêm substâncias além do limite permitido para o consumo humano de acordo com as regras do Ministério da Saúde (a Portaria 2.914 de 2011). A parte positiva é que, com este estudo, os moradores saberão melhor o que estão consumindo e poderão agir para corrigir esses problemas com ações próprias e com solicitações ao poder público. Além disso, o monitoramento poderá ajudar a ver como as ações que estão sendo desenvolvidas pelo projeto terão efeito na melhoria das águas.

Durante a execução do projeto, foram realizadas três campanhas de monitoramento laboratorial e cinco campanhas participativas com os moradores participantes do Plantando Águas. De maneira geral, as águas analisadas em comunidades rurais de Itapetininga, Piedade, Iperó, Salto de Pirapora, São Carlos e Porto Feliz são para uso doméstico, recreação, irrigação, abastecimento público e criação de animais. “Os resultados que mais chamaram a atenção foram os de poços coletivos nos assentamentos. Observamos repetidamente alguns parâmetros fora do limite permitido para o consumo humano segundo a Portaria 2.914 de 2011”, ressalta a bióloga Aline G. Zaffani, coordenadora do monitoramento da água feito durante o projeto Plantando Águas. Esses parâmetros são: alumínio, amônia, ferro, zinco e manganês. “Com relação às águas superficiais, alguns pontos de monitoramento também mostraram parâmetros fora do limite, o que pode restringir o uso na propriedade como é o caso da irrigação de hortaliças”, completa a Aline.

A água pode ser avaliada de acordo com diversos parâmetros. No caso do monitoramento participativo do projeto, realizado a cada dois meses, foram analisados o pH, a alcalinidade da água e a quantidade de fosfato, nitrito, nitrato e amônia (veja detalhes no box) contidos nela. “Dessa forma, sabemos como o rio, poço ou represa se comporta nas estações seca e chuvosa”, explica a bióloga. “Isso também permite avaliar os impactos de ações humanas como o lançamento de poluentes, a agricultura, o desmatamento, a recuperação de matas ciliares na qualidade da água”, diz. Com essas informações é possível identificar áreas prioritárias para intervenções, propor ações de minimização dos impactos, requerer medidas punitivas para poluidores e conhecer a qualidade da água usada na propriedade para o cultivo de gêneros alimentícios e de criação de animais.

Um dos objetivos do monitoramento é envolver as comunidades com a questão da qualidade da água. “Ao abordar esse tema, estamos favorecendo o despertar dos agricultores para os problemas e às possíveis consequências que eles podem acarretar com relação ao uso dos recursos hídricos”, acredita Aline. A identificação de possíveis fontes de contaminação, a necessidade de mudança de comportamentos e a disseminação das informações são pontos para a educação ambiental dos participantes e de outras pessoas que tenham contato com eles.
A coordenadora lembra que o período de monitoramento no Plantando Águas (um ano) ainda é curto para observar mudanças decorrentes das ações de plantio e de saneamento. No entanto, pelas características já observadas nas análises e pelas ações desenvolvidas em alguns locais, é possível afirmar que os benefícios serão observados em pouco tempo. Os resultados completos do monitoramento ficarão disponíveis no site: https://www.iniciativaverde.org.br/biblioteca-nossas-publicacoes.php .

Parâmetros observados
Na avaliação da qualidade das águas foram medidas características biológicas, físicas e químicas da água:
Alumínio – é incomum ser encontrado em grande quantidade em águas naturais doces. Pesquisas indicam que seu consumo elevado está associado ao desenvolvimento do Mal de Alzheimer. Nos Assentamentos Nova São Carlos, Santa Helena, 23 de Maio, Carlos Lamarca e em Porto Feliz, as águas subterrâneas apresentaram altos valores do metal. Em uma medição em Porto Feliz, chegou a 60 vezes acima do limite permitido. Uma das explicações pode ser a forma de manejo do solo. Neste caso, a recomendação é o uso de matéria orgânica no solo para ajudar a fixar o metal. Mesmo assim, é importante uma investigação mais cuidadosa.
Coliformes termotolerantes – é um conjunto de microrganismos (bactérias) como a Escherichia coli. Como eles existem em fezes de pessoas e animais, são usados para indicar se a água pode ter sido contaminada por esgotos. Em São Carlos, Piedade e na Fazenda Ipanema, foram encontrados valores acima do permitido.
Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO) – indica a quantidade de oxigênio consumido durante determinado tempo, relacionado ao aumento da atividade de microrganismos devido à presença de matéria orgânica. Uma DBO alta significa pouco oxigênio, afeta os peixes e causa cheiro desagradável. Em alguns rios (no Horto Bela Vista, Piedade e Cafundó) e açudes (Assentamentos Fazenda Ipanema, Carlos Lamarca e 23 de Maio), foram encontrados valores acima do limite.
Ferro – não é tóxico na água, mas dá sabor e pode manchar roupas e utensílios. Além disso, pode acumular nas tubulações e favorecer o desenvolvimento de bactérias que contaminam a água. Todos os pontos analisados apresentaram ferro acima do limite.
Fósforo Total – o fósforo aparece em águas naturais devido, principalmente, às descargas de esgotos sanitários. A matéria orgânica fecal e os detergentes constituem a principal fonte. As águas drenadas em áreas agrícolas e urbanas podem provocar a sua presença excessiva, como pelo excesso de adubos químicos. Em grande quantidade pode causar eutrofização (níveis altos de nutrientes, gerando acúmulo de matéria orgânica em decomposição e grande desenvolvimento de algas). Praticamente, em todos os locais foram verificados valores maiores do que o permitido.
Manganês – Tem comportamento semelhante ao do ferro. Sua presença deixa a água com cor negra. Generalizando, em todos os locais foram verificados valores maiores do que o permitido.
Série de Nitrogênio – os esgotos sanitários são a fonte de nitrogênio em águas naturais. Nas áreas agrícolas, o escoamento das águas da chuva pelos solos fertilizados por adubos químicos também contribui. A atmosfera é outra fonte devido a diversos mecanismos. O nitrogênio pode ser encontrado nas águas nas formas de nitrogênio orgânico, amoniacal, nitrito e nitrato. As duas primeiras indicam contaminação recente ou próxima e as duas últimas, que a fonte de contaminação está mais afastada. De modo geral, todos os locais têm valores maiores do que o permitido.
Turbidez – quanto a luz que atravessa a água é atenuada pela presença de partículas suspensas (como argila, detritos orgânicos, algas e bactérias). Além de deixar a água turva, uma turbidez alta afeta a qualidade para seu uso e o desenvolvimento de plantas aquáticas e peixes. Nas amostras feitas, este item ultrapassou os limites em alguns rios como no Cafundó e em Piedade.
Zinco – É comum em águas naturais e necessário ao funcionamento do corpo humano. Porém, acima do limite permitido confere gosto e tonalidade leitosa em águas alcalinas. Somente em Porto Feliz foram verificados valores maiores que o permitido.