Estiagem atrapalha até os plantios

Estiagem atrapalha até os plantios

Categoria(s): Arquivo

Publicado em 16/07/2015

Por Isis Nóbile Diniz
Foto: Pedro Barral 

Os plantios de florestas normalmente são feitos no verão, período com a previsão de chuva entre outubro e março. Mas, nos dois últimos anos, tem chovido menos que o normal, o que afetou vários projetos de recuperação florestal realizados pela Iniciativa Verde como o Plantando Águas, implementado no interior de São Paulo. Inicialmente, estava previsto o plantio de 20 hectares de matas ciliares e 30 hectares de sistemas agroflorestais no início de 2014 nos municípios de Iperó, Itapetininga, Piedade, Porto Feliz, Salto de Pirapora e São Carlos. Devido à seca, esses plantios tiveram que ser feitos na temporada do fim de 2014 e início de 2015.

Lamentavelmente, o plantio das árvores que ajudará a recuperar os recursos hídricos do estado foi prejudicado pela própria falta de água. Eles foram adiados porque as mudas necessitam de uma grande quantidade de água distribuída nos primeiros meses de vida delas para poderem crescer, depois de inseridas no local. Esse período é crucial para o estabelecimento das árvores no campo. Longos períodos de estiagem comprometem o enraizamento das mudas, além de deixar os plantios mais suscetíveis a problemas relacionados à seca como o fogo.
“Normalmente, os plantios são realizados com a aplicação de hidrogel (material que retém a umidade no solo) no berço (buraco) onde são colocadas as mudas. Esse produto garante a sobrevivência delas em pequenos períodos de estiagem, porém seu uso não substitui a necessidade de irrigação ou de realizar o plantio na época de ocorrência das chuvas”, conta Pedro Barral, diretor florestal da Iniciativa Verde. Além disso, o hidrogel também precisa de água. Ele necessita ser hidratado antes de sua aplicação para, aos poucos, liberar água às plantas.

Em alguns locais do interior de São Paulo, como o caso do Vale do Ribeira (projeto Iniciativa BNDES Mata Atlântica), os plantios efetivados pela instituição puderam ter continuidade com o emprego de uma quantidade maior de hidrogel. Mas, além do aumento do volume de material usado, houve a necessidade de maior cuidado do que o já despendido aos plantios nos locais em que foi possível implantar as mudas. “Como, por exemplo, plantar apenas em áreas mais próximas a rios”, conta Julianna Colonna, gestora ambiental.

A culpa é de São Pedro?
O ano de 2014 foi o 13º período chuvoso (outubro a março) mais seco desde que a Estação Meteorológica (EM) do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da Universidade de São Paulo (USP) em 1932 começou a medir a precipitação (quantidade de água que cai do céu) na Região Metropolitana de São Paulo, segundo o especialista em precipitação, Augusto José Pereira Filho, professor do IAG/USP. “O prognóstico climático para o verão de 2014 indicava chuvas próximas do normal. Os quase 20 modelos que são usados no prognóstico falharam na avaliação do clima”, explica.

Apesar da surpresa, essa é uma variabilidade do clima. “O clima muda, o que é normal”, afirma Pereira Filho. Por exemplo, de acordo com o especialista, desde que começaram as medições, o período chuvoso do ano de 1941 foi o mais seco. “Portanto, não faz sentido falar que essa seca foi recorde em três mil anos. Aliás, os períodos chuvosos dos últimos quatro anos estão entre os dez mais chuvosos de toda a série histórica de 81 anos”, revela.

De acordo com o meteorologista, o que causou a recente seca foi um fenômeno comum chamado sistema de alta pressão do Atlântico Sul que apresenta maior ou menor intensidade e abrangência espacial dependendo dos padrões de circulações atmosféricas. Esse sistema de alta pressão vai da África do Sul até o Nordeste e, às vezes, ocupa uma área ainda maior e deixa São Paulo debaixo desse ar mais seco e mais quente, como ocorreu no início do ano. Como esse ar pesa mais e é mais estável que o ar úmido, a umidade não causou chuva na região. Em dezembro de 2013, as chuvas ficaram concentradas mais ao norte provocando enchentes no Espírito Santo e no Rio de Janeiro. “Temos que estar cientes destas variações e nos preparar para elas”, ressalta o professor.

“A seca de 2014 foi muito intensa como resultado da diminuição das chuvas associadas a sistemas de precipitação mais prolongados (chamado Zona de Convergência do Atlântico Sul)”, conta Pereira Filho. Essa Zona se estende desde a Amazônia até o Atlântico Sul-Central. O ar úmido vai do Oceano Atlântico em direção à bacia Amazônica. Lá, essa água se recicla com chuvas e transporte de umidade para o Sul e Sudeste do Brasil. A chuva na Amazônia volta para o oceano por meio dos rios. Alguns fatores como, por exemplo, a rotação da Terra e a Cordilheira dos Andes impedem a dispersão da chuva para o oeste. “Nesse sentido, somos cidadãos do Atlântico. Se a Amazônia fosse inteira desmatada, pesquisas indicam que haveria uma redução da precipitação na Amazônia e, por conseguinte, no Sul e Sudeste do Brasil”, completa.

Essa falta de chuva acabou afetando o ano de 2015. Como o solo está mais seco, leva mais tempo para a umidade voltar às condições médias, mesmo com a chuva que tem caído no Sudeste. Por isso, o volume de água das represas demora a subir. Daí a importância do plantio de árvores nativas.

A Iniciativa Verde recupera áreas degradadas de matas ciliares como de Joanópolis (foto), um dos municípios que fazem parte do Sistema Cantareira – trabalho que, futuramente, trará benefícios ao reservatório, pois a vegetação colabora com a regulação do sistema hídrico local. “As árvores do Plantando Águas e da Iniciativa Verde em geral, com certeza, vão diminuir a erosão das áreas, o que garante maior proteção aos rios. Também aumentarão a infiltração das chuvas no solo. Mesmo que sejam poucas, essas plantas ajudarão a armazenar mais água no solo e, assim, recarregar o rio na época de estiagem. A maior cobertura vegetal também aumentará a umidade do local, o que é benéfico para o microclima”, diz Colonna.